Eu sempre tive medo…
A gente costuma ter medo quando está solto no ar. Embora a gravidade exista por aí, não faltam motivos para que o medo nos tire do chão. Sair do chão não corresponde necessariamente a afastar os pés do concreto, da grama, do afeto. Sair do chão é uma espécie de desencontro entre você e o mundo à sua volta. Aliás, quantas vezes você já saiu do chão hoje?
Vejamos… Em alguns momentos a vida nos tira peças importantes do quebra cabeça. Não que você ou eu não saibamos que essas peças poderão faltar um dia. Sabemos. Mas nunca sentimos de fato sua ausência enquanto não somos confrontados pela brecha. E pronto! Aí está um fato que tira a gente do chão. Coloca-nos no ar. O ar das incertezas, das condições difusas, de não saber qual o próximo passo neste chão conflituoso.
Algumas esperas são muito mais dolorosas do que outras. A espera da saudade é densa, afinal: qual saudade é possível pegar nas mãos? A saudade do amigo? A saudade do amor? A saudade familiar? A saudade de você mesmo? Nenhuma destas saudades é passível de posse (aliás, não vamos tentar transformar tudo em posse!) e, então, nos joga no rarefeito: a saudade é o clima rarefeito do coração. Em determinados aspectos, envolve o corpo, a mente, a psique. Em outros, envolve lágrimas e distração. Mas, em todos os momentos e aspectos, envolve diretamente o coração.
Sentir saudade é sentir-se vivo
É sentir-se agente do mundo, agente da história. Afinal, conquanto você esteja inconsciente, sentir saudade é resultado de viver. Viver resulta em saudade. A saudade da escola, da diversão, dos carinhos, das fortalezas. Viver não é seguro, mas pode ser mais solidário. E a saudade é a insegurança da vida (uma das maiores inseguranças da jornada). Raramente saberemos quando terá fim, solução ou alimento – a saudade também é fome sem dieta específica, sem remédio duradouro. É um fio importante da corda. É um combustível importante da mudança; sem ela, a vida torna-se apenas chão, concreto, decisão, desapego, egoísmo.
Quando olharmos para trás, sentiremos várias saudades, reconheceremos uma porção delas. Contudo, teremos apenas uma saudade, específica: a saudade da vida, que vai chegando ao fim sem contestar. E, neste momento, não há chão que te segure. A vida está aí para ensinar-lhe de fato um diálogo final: viver todas as suas saudades valeu a pena. Sair do chão também.
(Este é um texto de um dos colaboradores. Os comentários, opiniões e colocações são de inteira responsabilidade do autor. Não necessariamente refletem a opinião deste blog)